sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Sr. "Curva-de-Rio"

Ele era um autêntico Curva-de-rio. Tudo que era complicado, malfeito ou atrapalhado sempre ia parar nas suas mãos. Em seu trabalho passava o dia a descascar os abacaxis administrativos que a sua função impunha. Sua sala era um autêntico amontoado de pepinos burocráticos. Tudo o que não prestava e era desagradável parava ali. Brigas de funcionários terceirizados, equipamentos quebrados, elevadores parados, funcionários doentes ou deprimidos. Tudo, absolutamente tudo de aborrecido se dirigia instintivamente para a mesa do nosso herói. Tal qual nas curvas dos rios, onde param todos os bagulhos, móveis velhos, embalagens descartáveis e sujeiras em geral, sua sala vivia repleta dos maus fluídos e das cargas negativas das coisas que não dão certo. O Curva-de-rio ia tocando a sua vida sofrida mas honesta. Às vezes pensava consigo mesmo: "Puxa, mas os outros levam a vida de maneira tão leve, vivem celebrando por aí, por que comigo não pode ser igual"?

E assim passava os dias. Assuntos e mais assuntos cabeludos desfilando pela sua mesa. Resolvia um e apareciam mais dez. Notava a enorme má vontade dos colegas em resolver as coisas, e sabia que todas aquelas omissões e negligências somadas contribuíam em muito para que a sua rotina se tornasse ainda mais trabalhosa e cansativa. Jamais ouvia um "obrigado", mas vivia recebendo muxoxos dos funcionários que viam o Curva-de-rio como a panaceia para todos os problemas.

Isso não deu certo? Manda para o Curva... Aquilo vai complicar? Encaminha para o Curva... Caiu, bateu, machucou? Só o Curva pode dar um jeito!

O interessante é que não enviavam nada de bom para o Curva-de-rio.

Restou ao Curva se conformar com sua triste sina. Uma vida feita para servir aos próximos. Ampará-los, ajudá-los, aconselhá-los, encaminhá-los. Dar aquela força para que os entulhos se desprendessem da curva do rio. Para que liberassem espaço, pois atrás vinham mais sujeiras e materiais inservíveis a serem tratados.

Para assuntos agradáveis, homenagens, descontrações e brincadeiras, jamais se lembravam do Curva-de-rio. Agora, para ver como seria limpa a área do evento ou quem carregaria as tralhas usadas na recepção, adivinhem se não lembravam rapidinho do Curva-de-rio?

Assim seguiu, caudaloso e recheado de imbróglios, o rio da vida do Curva-de-rio. Até que se aposentou por tempo de serviço e, totalmente parado, sem nenhuma chateação para enfrentar, logo caiu doente e foi pro saco, sem dó nem piedade de ninguém.

Salve o Curva-de-rio. Uma vida de devoção ao trabalho árduo que ninguém queria fazer. Sem glamour nem reconhecimento. Apenas tubérculos para serem descascados, cozinhados e digeridos.

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