
Como miquinhos amestrados, estamos sendo, todos, orquestrados por poderosos grupos econômicos, empresas, meios de comunicações e detentores das mais modernas tecnologias.
Apesar de nos acharmos tão livres, leves e soltos, estamos, isto sim, sendo o tempo todo compelidos a agirmos desta ou daquela maneira, a usarmos esta ou aquela grife, a comprarmos este ou aquele carro, a assistirmos este ou aquele filme, a ouvirmos esta ou aquela música...
Os comportamentos têm cada vez mais sido ditados pela televisão e pela internet. As poderosas redes televisivas dão a pauta de como a sociedade vai se comportar naquele período.
Pensem um pouco sobre o cronograma de vida e atividades que nos impõem durante o ano:
Em janeiro, ao mesmo tempo que falam em férias escolares, dando sugestões de onde ocupar os pimpolhos, falam também sobre IPVA, IPTU e material escolar. Sempre a mesma lenga-lenga.
Depois vem o Carnaval, e só se fala nesse assunto, diuturnamente. Mostram inúmeros carros descendo para o litoral, porque ficou estabelecido, sabe Deus por quem, que Carnaval é para ser curtido na praia. Desfiles, fofocas sobre as rainhas de bateria e suas infantilidades. Quantos mililitros de silicone as musas colocaram. Quanto malharam. Com quem estão namorando. Haja saco. A música então, só samba-enredo de manhã até a noite. Um porrilhão de surdos e cuícas massacrando diretamente os nossos pobres tímpanos.
Após o Carnaval, o assunto passa a ser o início das aulas e o aumento do trânsito já caótico, devido às mamães que insistem em parar em fila dupla na frente dos colégios dos rebentos.
Fala-se também dos trotes aplicados aos calouros nas faculdades e das eventuais atrocidades que essa prática costuma trazer todos os anos.
Abril, mês da Semana Santa. E a mídia já começa a insuflar a população para as viagens ao interior. Assim como o Carnaval tem que ser curtido na praia, a Semana Santa deve ser aproveitada no interior. É outra regra que assola o nosso inconsciente coletivo.
Por que o cara não pode curtir o Carnaval no campo ou na montanha e a Semana Santa na praia? Onde está escrito que essa norma não pode ser subvertida? Eu, particularmente, todas as vezes em que inverti os roteiros pré-programados pela massificação onipresente, me dei extremamente bem, ficando em lugares tranquilos e menos badalados.
E assim passa o ano: Dias das mães, férias de julho, dias dos pais, dias das crianças... e, finalmente, o auge da mesmice e do comportamento clônico: Natal e Ano Novo. Aí é que o caldo entorna de vez. Graças a Deus, passamos por esse período recentemente e vai demorar um pouco para chegar novamente.
Aí sim, a micaiada amestrada se lambuza de tanto fazer a mesma coisa junta e igual, exatamente ao mesmo tempo.
Todo mundo se fodendo junto nos centros de compras, sejam shoppings chiquérrimos e metidos à besta, ou os centros populares de varejo, como a 25 de Março em São Paulo, ou o Sahara no Rio de Janeiro.
A desinteligência coletiva é tanta, que todo o ano, passado o Natal, as lojas ficam às moscas, com liquidações de até 70% de desconto. Mas isso, só alguns poucos pensantes e autênticos conseguem vislumbrar e aproveitar. Para eles, tiro o meu chapéu.
E também, e principalmente, nesse período, a ditadura comportamental assola a todos.
O Natal DEVE ser passado em família, em volta do peru e próximo à árvore de Natal.
O Ano Novo DEVE ser passado na praia, de branco, pulando sete ondinhas e comendo romã. Claro que depois de suportar as 10 horas de tráfego pesado e engarrafamento, para só então poder pisar na areia suja e contaminada.
Não sou contra a alegria, contra as viagens e muito menos contra as deliciosas reuniões familiares. Não sou contra dar presentes a quem amamos ou admiramos. Muito pelo contrário.
Sou contra, isso sim, o fato de sermos impingidos a fazer isso sempre que o patrão mandar.
Não sou contra a música. Por sinal, adoro música. Mas precisa ser a música que eu escolhi para curtir. Não aquela que toca à exaustão nas rádios e na TV.
Curto tudo que há de bom na vida, mas deve ser tudo aquilo que represente algo de bom para mim, para minha família e para a sociedade em geral. Não o que nos empurram goela abaixo durante o ano todo.
Acho que só a educação séria e comprometida das nossas crianças pode fazer com que, no futuro, passemos a ter mais cidadãos pensantes, atuantes e questionadores. Que não engulam, sem avaliar ou cogitar, todo o lixo e todas as regras de comportamento que nos são delicada e discretamente impostas.
Créditos:
Pesquisando imagens sobre mesmice, me deparei com o blog Humor em textos, de Paulo Tamburro, cujo post muitíssimo bem humorado sobre este tema pode ser lido aqui.