Esta vai para todas essas pessoas muito parecidas entre si, que andam às pencas por aí. Com o corte de cabelo padrão, com os trajes padrão, com as expressões e chavões padrão. Pessoas com falsos sorrisinhos de cordialidade no canto da boca. Treinadas para parecerem educadas e eficientes, abusando da praga do gerundismo. Pessoas que, no fim, só se preocupam com a enorme área adjacente ao próprio umbigo. Não estão nem aí para o coletivo, nem para os próximos que as rodeiam.
Hoje, prega-se das mais variadas formas, que o cidadão moderno deva ser bonzinho. Ele deve se enquadrar e comportar-se de determinadas maneiras, e dentro de certos critérios e padrões, caso almeje alguma conquista, seja pessoal, seja profissional.
Há inúmeras cartilhas de etiquetas, que ditam aquilo que pode ou não ser feito ou dito em determinadas situações clichês, como entrevistas de emprego, encontros amorosos e compromissos oficiais e sociais.
Para cada situação, o sujeito deve usar uma persona, uma máscara, um comportamento. Mais do que nunca, a sociedade está se baseando nas aparências, e não nas essências dos indivíduos.
Em muitos meios de trabalho e atividades, a pessoa pode ser competentíssima, talentosíssima, porém, se não estiver envergando os trajes da moda atual, nem com a aparência que a mídia diz ser a aparência padrão atual, certamente estará fadada ao fracasso, seja na seleção, na entrevista ou na dinâmica de grupo.
Atualmente, a única exceção para esse conjunto de regras são os concursos públicos, que têm se pautado pela objetividade na seleção das pessoas. Num concurso honesto, bem realizado e transparente, certamente as pessoas melhor preparadas e com mais conteúdo serão as aprovadas. Não necessariamente as mais bonitas e bem apresentadas nos aspectos físicos e de vestimentas.
Nessa ordem toda de arranjos para que a aparência e a presença física e o carisma ditem as normas e os padrões, outra coisa tem me saltado aos olhos. O fato das pessoas serem, de alguma forma, compelidas a parecer boazinhas e inofensivas. Note bem, eu disse parecer boazinhas. Não precisam ser boas de verdade. Mas têm que ostentar uma aura de beleza, de delicadeza, de serem aparentemente inofensivas aos demais participantes dos grupos em que estejam inseridas.
Na verdade, a meu ver, as pessoas cada vez menos precisam ser genuinamente boas, mas precisam, isso sim, parecer boazinhas, só isso.
Isso leva a algumas situações limites, em que tais pessoas, ditas boazinhas, podem vir a agir de maneira completamente egoísta, leviana e racional, pensando só em si e nos seus interesses, em detrimentos dos demais.
Para mim, esses sustos e surpresas negativas, que todos nós tomamos com certas atitudes de pessoas “boazinhas”, apenas revelam que elas são, na realidade, só isso, boazinhas. Não são pessoas genuinamente boas. Apenas vestem a máscara social da bondade.
Por isso, costumo distinguir muito bem esses dois tipos de gente no mundo: o bom e o bonzinho. O bom é o sujeito correto, reto, transparente, de boa índole, que não se corrompe, e valoriza e respeita o ser humano acima de tudo. O bonzinho é apenas isso, bonzinho. Mas não se surpreenda se ele eventualmente cravar uma faca nas suas costas.
Para fechar, na minha experiência pessoal e de vida, percebo que, na grande maioria dos casos, as pessoas preferem tratar com os bonzinhos e boazinhas de plantão. Porque, teoricamente, a relação fica mais fácil, uma vez que é completamente baseada na hipocrisia, na falsidade e na ausência da verdade.
As pessoas realmente boas incomodam, pois têm o desagradável hábito de primar pela verdade e pela transparência, que em muitos momentos chegam a ser tidas como coisas desagradáveis e abjetas, neste admirável mundo novo em que vivemos.
Cada vez mais, o importante é parecer ser bom, e não realmente ser bom, na maior acepção que essa palavra possa ter.
Não faço a menor questão de ser um homem bonzinho. Luto, diariamente, para tentar ser um homem bom e justo.